UERJ 2012 – Questão 9

Linguagens / Português / Língua e Funções / Interpretação de texto
Sobre a origem da poesia
A origem da poesia se confunde com a origem da própria linguagem.
Talvez fizesse mais sentido perguntar quando a linguagem verbal deixou de ser poesia. Ou: qual a origem do discurso não poético, já que, restituindo laços mais íntimos entre os signos e as coisas por eles designadas, a poesia aponta para um uso muito primário da linguagem, que parece anterior ao perfil de sua ocorrência nas conversas, nos jornais, nas aulas, conferências, discussões, discursos, ensaios ou telefonemas1.
Como se ela restituísse2, através de um uso específico da língua, a integridade entre nome e coisa − que o tempo e as culturas do homem civilizado trataram de separar no decorrer da história.
A manifestação do que chamamos de poesia hoje nos sugere mínimos flashbacks de uma possível infância da linguagem, antes que a representação rompesse seu cordão umbilical, gerando essas duas metades − significante e significado.
Houve esse tempo? Quando não havia poesia porque a poesia estava em tudo o que se dizia? Quando o nome da coisa era algo que fazia parte dela, assim como sua cor, seu tamanho, seu peso? Quando os laços entre os sentidos ainda não se haviam desfeito, então música, poesia, pensamento, dança, imagem, cheiro, sabor, consistência se conjugavam em experiências integrais, associadas a utilidades práticas, mágicas, curativas, religiosas, sexuais, guerreiras?
Pode ser que essas suposições tenham algo de utópico3, projetado sobre um passado pré-babélico, tribal, primitivo. Ao mesmo tempo, cada novo poema do futuro que o presente alcança cria, com sua ocorrência, um pouco desse passado.
Lembro-me de ter lido, certa vez, um comentário de Décio Pignatari, em que ele chamava a atenção para o fato de, tanto em chinês como em tupi, não existir o verbo ser, enquanto verbo de ligação. Assim, o ser das coisas ditas se manifestaria nelas próprias (substantivos), não numa partícula verbal externa a elas4, o que faria delas línguas poéticas por natureza, mais propensas à composição analógica.
Mais perto do senso comum5, podemos atentar para como colocam os índios americanos falando, na maioria dos filmes de cowboy − eles dizem “maçã vermelha”, “água boa”, “cavalo veloz”; em vez de “a maçã é vermelha”, “essa água é boa”, “aquele cavalo é veloz”. Essa forma mais sintética, telegráfica, aproxima os nomes da própria existência − como se a fala não estivesse se referindo àquelas coisas, e sim apresentando-as (ao mesmo tempo em que se apresenta).
No seu estado de língua, no dicionário, as palavras intermedeiam6 nossa relação com as coisas, impedindo nosso contato direto com elas. A linguagem poética inverte essa relação, pois, vindo a se tornar, ela em si, coisa, oferece uma via de acesso sensível mais direto entre nós e o mundo7. (...)
Já perdemos a inocência de uma linguagem plena assim. As palavras se desapegaram das coisas, assim como os olhos se desapegaram dos ouvidos, ou como a criação se desapegou da vida. Mas temos esses pequenos oásis − os poemas − contaminando o deserto da referencialidade9.
Arnaldo Antunes, www.arnaldoantunes.com.br
No último parágrafo, o autor se refere à plenitude da linguagem poética, fazendo, em seguida, uma descrição que corresponde à linguagem não poética, ou seja, à linguagem referencial. Pela descrição apresentada, a linguagem referencial teria, em sua origem, o seguinte traço fundamental:
a) O desgaste da intuição.
b) A dissolução da memória.
c) A fragmentação da experiência.
d) O enfraquecimento da percepção.

Veja outras questões semelhantes:

UERJ 2009 – Questão 18
The author claims that skepticism is an obstacle to the adoption of heroes. The reason for this is best expressed in the following fragment: ...
Base dudow 2000 – Questão 51
MEU CARO DEPUTADO ...
UERJ 2006 – Questão 16
In the text, the argumentation is structured by means of descriptions of situations and restrictions. The following elements contribute to this structural organization: a) definite articles and gradable adjectives b) forceful tone and contrastive connectives c) short paragraphs and independent clauses d) plural personal pronouns and enumerative conjuncts
UERJ 2011 – Questão 13
O personagem reclama de uma vida na qual se dedicou a ações que agora vê como negativas.Essas ações estão melhor descritas em: a) Tentei debalde canalizar para termo razoável esta prosa que se derrama como a chuva (ref.3) b) E depois guardar comida para os filhos, para os netos, para muitas gerações. (ref.8) c) Coloquei-me acima da minha classe, creio que me elevei bastante. (ref.9) d) fui guia de cego, vendedor de doce e trabalhador alugado. (ref.10)
UERJ 2006 – Questão 40
Os resultados das avaliações da qualidade da água do lago indicaram alterações na concentração de alguns de seus componentes, condizentes com o aumento da poluição orgânica, conforme mostra o gráfico abaixo. As curvas que correspondem às variações na concentração de micro-organismos aeróbios e anaeróbios, respectivamente, são: a) I - II b) I - III c) II - I d) II - III