UERJ 2012 – Questão 13

Linguagens / Português / Pontuação / Outros
A palavra
Tanto que tenho falado, tanto que tenho escrito  − como não imaginar que, sem querer, feri alguém? Às vezes sinto, numa pessoa que acabo de conhecer, uma hostilidade surda, ou uma reticência de mágoas. Imprudente ofício é este, de viver em voz alta.
Às vezes, também a gente tem o consolo de saber que alguma coisa que se disse por acaso ajudou alguém a se reconciliar consigo mesmo ou com a sua vida de cada dia; a sonhar um pouco, a sentir uma vontade de fazer alguma coisa boa.
Agora sei que outro dia eu disse uma palavra que fez bem a alguém. Nunca saberei que palavra foi; deve ter sido alguma frase espontânea e distraída que eu disse com naturalidade porque senti no momento − e depois esqueci.
Tenho uma amiga que certa vez ganhou um canário, e o canário não cantava. Deram-lhe receitas para fazer o canário cantar; que falasse com ele, cantarolasse, batesse alguma coisa ao piano; que pusesse a gaiola perto quando trabalhasse em sua máquina de costura; que arranjasse para lhe fazer companhia, algum tempo, outro canário cantador; até mesmo que ligasse o rádio um pouco alto durante uma transmissão de jogo de futebol... mas o canário não cantava.
Um dia a minha amiga estava sozinha em casa, distraída, e assobiou uma pequena frase melódica de Beethoven − e o canário começou a cantar alegremente. Haveria alguma secreta ligação entre a alma do velho artista morto e o pequeno pássaro cor de ouro?
Alguma coisa que eu disse distraído  − talvez palavras de algum poeta antigo  − foi despertar melodias esquecidas dentro da alma de alguém. Foi como se a gente soubesse que de repente, num reino muito distante, uma princesa muito triste tivesse sorrido. E isso fizesse bem ao coração do povo; iluminasse um pouco as suas pobres choupanas e as suas remotas esperanças.
RUBEM BRAGA PROENÇA FILHO, Domício (org.). Pequena antologia do Braga. Rio de Janeiro: Record, 1997
Toda a indagação do cronista acerca da palavra se baseia na diferença entre a importância que ela pode ter, por um lado, para quem a escreve e, por outro, para quem a lê. O par de vocábulos que melhor exemplifica essa diferença no texto é:
a) esqueci − feri
b) ofício − consolo
c) espontânea − secreta
d) reconciliar − despertar
Esta questão recebeu 1 comentário

Veja outras questões semelhantes:

UERJ 2009 – Questão 1
A argumentação do autor se pauta pela cautela, combatendo principalmente os discursos que fazem generalizações apressadas. ...
FUVEST 2012 – Questão 46
Destes comentários sobre os trechos sublinhados, o único que está correto é: ...
UFSM 2011 ps3 - todas menos Ing, Esp 2011 – Questão 26
Em vários poemas de A rosa do povo, de Carlos Drummond de Andrade, há na escuridão uma luz que brilha (um fraco pavio’’, uma pequena ampola fulgurante, uma lanterna, o sucedâneo da estrela nas mãos ), caracterizando a noite como um espaço...
UFSCar - Por e Ing 2009 – Questão 5
Na frase — Estilo o senhor Ayrton só o terá..., Lobato usa um recurso de ênfase que consiste em: a) deixar uma informação subentendida. b) fazer uma comparação paralela. c) relacionar muitas ideias ao mesmo tempo. d) iniciar a oração com um termo que se repete depois. e) empregar o verbo em um tempo pretérito.
Base dudow 2000 – Questão 60
Manuel Bandeira escreveu vários poemas sobre a cidade do Recife. Graciliano Ramos tomou continuamente a natureza nordestina como paisagem. Assinale a alternativa que melhor expressa essa igualdade. ...