UERJ 2011 – Questão 5

Linguagens / Literatura / Romantismo / Brasil: Prosadores
Como e porque sou romancista
Minha mãe e minha tia se ocupavam com trabalhos de costuras, e as amigas para não ficarem ociosas as ajudavam. Dados os primeiros momentos à conversação, passava-se à leitura e era eu chamado ao lugar de honra1.
Muitas vezes, confesso, essa honra me arrancava bem a contragosto de um sono começado ou de um folguedo querido; já naquela idade a reputação é um fardo e bem pesado2.
Lia-se até a hora do chá, e tópicos havia tão interessantes que eu era obrigado à repetição. Compensavam esse excesso, as pausas para dar lugar às expansões do auditório, o qual desfazia-se em recriminações contra algum mau personagem, ou acompanhava de seus votos e simpatias o herói perseguido.
Uma noite, daquelas em que eu estava mais possuído do livro, lia com expressão uma das páginas mais comoventes da nossa biblioteca3. As senhoras, de cabeça baixa, levavam o lenço ao rosto, e poucos momentos depois não puderam conter os soluços que rompiam-lhes o seio4.
Com a voz afogada pela comoção e a vista empanada pelas lágrimas, eu também cerrando ao peito o livro aberto, disparei em pranto e respondia com palavras de consolo às lamentações de minha mãe e suas amigas.
Nesse instante assomava à porta um parente nosso, o Revd.º Padre Carlos Peixoto de Alencar, já assustado com o choro que ouvira ao entrar – Vendo-nos a todos naquele estado de aflição5, ainda mais perturbou-se:
- Que aconteceu? Alguma desgraça? Perguntou arrebatadamente.
As senhoras, escondendo o rosto no lenço para ocultar do Padre Carlos o pranto e evitar seus remoques*, não proferiram palavra. Tomei eu a mim responder:
- Foi o pai de Amanda que morreu! Disse, mostrando-lhe o livro aberto.
Compreendeu o Padre Carlos e soltou uma gargalhada6, como ele as sabia dar, verdadeira gargalhada homérica, que mais parecia uma salva de sinos a repicarem do que riso humano. E após esta, outra e outra, que era ele inesgotável, quando ria de abundância de coração, com o gênio prazenteiro de que a natureza o dotara.
Foi essa leitura contínua e repetida de novelas e romances que primeiro imprimiu em meu espírito a tendência para essa forma literária [o romance] que é entre todas a de minha predileção?
Não me animo a resolver esta questão psicológica, mas creio que ninguém contestará a influência das primeiras impressões7.
 
JOSÉ DE ALENCAR
Como e porque sou romancista. Campinas: Pontes, 1990.
 
*remoque: zombaria, caçoada
Não me animo a resolver esta questão psicológica, mas creio que ninguém contestará a influência das primeiras impressões. (ref.7)
Ao final do texto o autor levanta uma questão, mas diz que não pode resolvê-la. Entretanto, a segunda parte da frase sugere que o autor tem uma resposta.
Este é um conhecido processo retórico, pelo qual o autor adota o procedimento indicado em:
a) criticar para negar
b) negar para afirmar
c) duvidar para justificar
d) reconhecer para criticar

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