Em 2008, o Brasil celebra a memória de Joaquim Maria Machado de Assis, o "Bruxo do Cosme Velho", que morreu há cem anos, no dia 29 de setembro, já reconhecido como o maior escritor brasileiro. Revisitar a obra de Machado pensada em seu conjunto é redescobrir um dos estilos mais originais e modernos da literatura universal.
TEXTO I
Esse texto é o último capítulo de "Memórias Póstumas de Brás Cubas", de Machado de Assis, obra que inaugura uma segunda etapa da produção de Machado.
Capítulo CLX - DAS NEGATIVAS
[...]
Este último capítulo é todo de negativas. Não alcancei a celebridade do emplastro, não fui ministro, não fui califa, não conheci o casamento. Verdade é que, ao lado dessas faltas, coube-me a boa fortuna de não comprar o pão com o suor do meu rosto. Mais; não padeci a morte de dona Plácida, nem a semidemência de Quincas Borba. Somadas umas coisas e outras, qualquer pessoa imaginará que não houve míngua nem sobra, conseguintemente que saí quite com a vida. E imaginará mal; porque ao chegar a esse outro lado do mistério achei-me com um pequeno saldo, que é a derradeira negativa deste capítulo de negativas: -Não tive filhos, não transmiti a nenhuma criatura o legado da nossa miséria.
("Memórias Póstumas de Brás Cubas", de Machado de Assis)
TEXTO II
O texto a seguir foi retirado da obra de Graciliano Ramos, "Vidas Secas". Esse romance completou, em agosto de 2008, 70 anos de sua primeira publicação. É narrado em 3a pessoa (ao contrário das obras anteriores de Graciliano) e pertence a um gênero intermediário entre romance e livro de contos.
Fabiano, uma coisa da fazenda, um triste, seria despedido quando menos esperasse. Ao ser contratado, recebera o cavalo de fábrica, peneiras, gibão, guarda-peito e sapatões de couro, mas ao sair largaria tudo ao vaqueiro que o substituísse.
Sinhá Vitória desejava possuir uma cama igual à de seu Tomás da bolandeira. Doidice. Não dizia nada para não contrariá-la, mas sabia que era doidice. Cambembes podiam ter luxo? E estavam ali de passagem.
Qualquer dia o patrão os botaria fora, e eles ganhariam o mundo, sem rumo, nem teria meio de conduzir os cacarecos. Viviam de trouxa amarrada, dormiriam bem debaixo de um pau.
Olhou a caatinga amarela, que o poente avermelhava. Se a seca chegasse, não ficaria planta verde. Arrepiou-se. Chegaria, naturalmente. Sempre tinha sido assim, desde que ele se entendera.
E antes de se entender, antes de nascer, sucedera o mesmo - anos bons, misturados com anos ruins. A desgraça estava em caminho, talvez andasse perto. Nem valia a pena trabalhar. Ele marchando para casa, trepando a ladeira, espalhando seixos com as alpercatas - ela se avizinhando a galope, com vontade de matá-lo.
("Vidas Secas" - Graciliano Ramos)
Os dois textos da narrativa brasileira lidos possuem um tema recorrente. Assinale a opção que contém esse tema.
a) O entusiasmo de Machado pelo país e pelo povo brasileiro e a falta de entusiasmo pelo país no texto de Graciliano.
b) O ácido humor do povo brasileiro apresentado pelos personagens das duas obras.
c) A morte como um instrumento de interpretação do mundo em Memórias Póstumas e, em Vidas Secas, descrita como degradação social.
d) A falta de sintonia com a realidade presente nos personagens das duas obras.
e) Os conflitos no ambiente familiar retratados nos dois romances.