UNESP 2011 – Questão 20

Linguagens / Português / Língua e Funções / Linguagem
O Bumba-Meu-Boi
Entre os autos populares conhecidos e praticados no Brasil – pastoril, fandango, chegança, reisado, congada, etc. – aquele em que melhor o povo exprime a sua crítica, aquele que tem maior conteúdo jornalístico, é, realmente, o bumba-meu-boi, ou simplesmente boi.
Para Renato Almeida, é o “bailado mais notável do Brasil, o folguedo brasileiro de maior significação estética e social”. Luís da Câmara Cascudo, por seu turno, observou a sua superioridade porque “enquanto os outros autos cristalizaram, imóveis, no elenco de outrora, o bumba-meu-boi é sempre atual, incluindo soluções modernas, figuras de agora, vocabulário, sensação, percepção contemporânea. Na época da escravidão mostrava os vaqueiros escravos vencendo pela inteligência, astúcia e cinismo. Chibateava a cupidez, a materialidade, o  sensualismo de doutores, padres, delegados, fazendo-os cantar versinhos que eram confissões estertóricas. O capitão-do-mato, preador de escravos, assombro dos moleques, faz-sono dos negrinhos, vai ‘caçar’ os negros que fugiram, depois da morte do Boi, e em vez de trazê- os é trazido amarrado, humilhado, tremendo de medo. O valentão mestiço, capoeira, apanha pancada e é mais mofino que todos os mofinos. Imaginem a alegria negra, vendo e ouvindo essa sublimação aberta, franca, na porta da casa-grande de engenho ou no terreiro da fazenda, nos pátios das vilas, diante do adro da igreja! A figura dos padres, os padres do interior, vinha arrastada com a violência de um ajuste de contas. O doutor, o curioso, metido a entender de tudo, o delegado autoritário, valente com a patrulha e covarde sem ela, toda a galeria perpassa, expondo suas mazelas, vícios, manias, cacoetes, olhada por uma assistência onde estavam muitas vítimas dos personagens reais, ali subalternizados pela virulência do desabafo”.
Como algumas outras manifestações folclóricas, o bumba-meu-boi utiliza uma forma antiga, tradicional; entretanto, fá-la revestir-se de novos aspectos, atualiza o entrecho, recompõe a trama. Daí “o interesse do tipo solidário que desperta nas camadas populares”, como o assinala Édison Carneiro. Interesse que só pode manterse porque o que no auto se apresenta não reflete apenas situações do passado, “mas porque têm importância para o futuro”. Com efeito, tendo por tema central a morte e a ressurreição do boi, “cerca-se de episódios acessórios, não essenciais, muito desligados da ação principal, que variam de região para região... em cada lugar, novos personagens são enxertados, aparentemente sem outro objetivo senão o de prolongar e variar a brincadeira”. Contudo, dentre esses personagens, os que representam as classes superiores são caricaturados, cobrindo-se de ridículo, o que torna “o folguedo, em si mesmo, uma reivindicação”.
Sílvio Romero recolheu os versos de um bumba-meu-boi, através dos quais se constata a intenção caricaturesca nos personagens do folguedo. Como o Padre, que recita:
 
Não sou padre, não sou nada
“Quem me ver estar dançando
Não julgue que estou louco;
Secular sou como os outros”
 
Ou como o Capitão-do-Mato que, dando com o negro Fidélis, vai prendê-lo
 
      “CAPITÃO – Eu te atiro, negro 
                            Eu te amarro, ladrão,
                       Eu te acabo, cão.”
Mas, ao contrário, quem vai sobre o Capitão e o amarra é o Fidélis
“CORO –  Capitão de campo
                      Veja que o mundo virou
                        Foi ao mato pegar negro
                         Mas o negro lhe amarrou.
CAPITÃO – Sou valente afamado
                       Como eu não pode haver;
                            Qualquer susto que me fazem
                      Logo me ponho a correr”.
 
(Luiz Beltrão. Comunicação e folclore. São Paulo: Edições Melhoramentos, 1971.)
Quem me ver estar dançando. – Mas o negro lhe amarrou. 
 
Nos dois versos acima, do exemplo de estrofes de um bumba-meu-boi recolhidas por Sívio Romero, as formas ver e lhe caracterizam um uso popular. Se se tratasse de um discurso obediente à construção formal em Língua Portuguesa, tais formas seriam substituídas, respectivamente, por
a) vir, o.
b) vir, a.
c) vesse, a.
d) visse, te.
e) vier, o.
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