FMABC 2019 – Questão 1

Linguagens / Português
No livro Human Nature in Politics, publicado em 1908, o deputado inglês Graham Wallas criticou a tendência, à época muito difundida, de imaginar que políticos pudessem encarnar o padrão de racionalidade, devoção ao bem comum e virtude cívica postulado pelos filósofos do século XVIII. Políticos – ele escreveu – representam a natureza humana como ela é, com seus defeitos e qualidades. Nem mais nem menos.
Wallas foi o primeiro a destacar o fosso que se abrira entre a política real que se desenrola no Parlamento e noutros órgãos do Estado e a percepção dela por parte da opinião pública. De fato, o Iluminismo criara a noção psicologicamente superficial de um cidadão filosofante, que nada tinha a ver com os cidadãos de carne e osso. Reflexões realistas sobre tal discrepância demoraram a aparecer, a de Wallas tendo sido pioneira e uma das mais instigantes.
Hoje sabemos que o fenômeno descrito por Wallas não era especificamente inglês, nem passageiro. Apareceu como uma reação a disfunções características dos estágios iniciais da democracia representativa, mas questionamentos semelhantes continuam a se manifestar por toda parte, em duas vertentes nitidamente diferenciadas: uma, como já se notou, referente às atitudes do cidadão comum em relação ao funcionamento das instituições, sobretudo dos legislativos e partidos políticos; e outra, mais propriamente filosófica, que se refere à ideologia liberal e ao mundo moderno.
O azedume da primeira vertente [...] tem sido regularmente pesquisado por entidades acadêmicas de todo o mundo, mas é difícil dizer se existe um consenso quanto a suas causas e formas características. Os antídotos administrados, de eficácia duvidosa, têm sido basicamente reformas institucionais, concentrando-se principalmente nos sistemas partidários e eleitorais. Tudo faz crer que o cidadão comum quer a ordem, quer um Estado capaz de mantê-la, não deseja a diluição ou a destruição do poder, muito menos experiências anarquistas tresloucadas, mas despreza a “política” no sentido comumente atribuído ao termo e não hesitaria em acabar com ela se soubesse como fazê-lo. Ou seja, valoriza a finalidade última do Estado, mas abomina o meio pelo qual ele atua, que é o sistema político.
Na raiz desse sentimento parece haver também um fator psicológico – o desconforto do cidadão comum diante de certas exterioridades da política, cujas funções ele não chega a compreender muito bem: a luta dos políticos pelo controle dos partidos e das chapas eleitorais; o labirinto das táticas do combate parlamentar; a retórica quase sempre entediante e o caráter vago ou francamente inexequível da maioria das promessas feitas durante as campanhas; entre outras.
A segunda vertente nutre-se de ideias filosóficas e estéticas mais abrangentes e muito mais radicais. Formou-se no bojo das grandes transformações que tiveram lugar na Europa desde o século XVIII: nas bases materiais da sociedade, a Revolução Industrial e o conflito de classes; na esfera do Estado e do Direito, a transição do Absolutismo ao Estado Constitucional; no plano da cultura e da arte, a chamada “idade da ideologia” e o advento do Romantismo; e sob o decisivo influxo da obra de Jean-Jacques Rousseau.
(LAMOUNIER, Bolivar. Liberais e antiliberais:
A luta ideológica do nosso tempo. São Paulo:
Companhia das Letras, 2016, p. 15 a 17)
Compreende-se corretamente do texto:
a) O autor refere o fato de Graham Wallas ser deputado inglês para demonstrar que ele conhecia por dentro as mazelas do Parlamento e de outros órgãos do Estado britânico.
b) Ao citar palavras de Graham Wallas em obra publicada em 1908, o autor reproduz o que, pelo que se compreende do ponto de vista do deputado, seria uma reflexão realista.
c) Quando Graham Wallas reconhece o fosso entre o que ocorria entre os muros das instituições estatais e a opinião pública, constata a unanimidade com que ela rejeita políticos cujo conceito de cidadão filosofante é superficial.
d) Ainda que o autor reconheça o caráter instigante das reflexões de Graham Wallas sobre política, não deixa de censurar a natureza extemporânea de suas críticas.
e) O autor discorre sobre a obra do deputado inglês Graham Wallas por considerá-la uma das mais instigantes no sentido de condenar a visão dos filósofos do século XVIII sobre a vida política.

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